11 de maio de 2015

BLIND FAITH - BLIND FAITH (1969)


Blind Faith é o álbum de estreia – e único – da banda britânica de mesmo nome, o Blind Faith. Seu lançamento oficial aconteceu em agosto de 1969, pelo selo Polydor Records. As gravações ocorreram entre 20 de fevereiro e 24 de junho de 1969, nos estúdios Olympic Studios e Morgan Studios, em Londres, na Inglaterra. A produção ficou por conta de Jimmy Miller.

O Blind Faith foi uma banda de curta duração, mas que deixou um álbum impressionante na história do Rock. E, também, não é qualquer grupo que pôde contar com talentos como Steve Winwood, Ginger Baker e Eric Clapton.

Capa alternativa do álbum
Os primórdios da formação do Blind Faith surgem a partir de meados de 1968, com a dissolução do fantástico Cream.

Em retrospecto, com o grupo sendo considerado como o primeiro “super-grupo”, o Cream havia se tornado uma potência financeira, vendendo milhões de discos em poucos anos e elevou o repertório do conjunto (e de cada um de seus membros) à popularidade internacional.

Apesar desse sucesso, a banda estava se desmoronando internamente, especialmente por causa da animosidade recorrente entre Jack Bruce e Ginger Baker, com Eric Clapton atuando como mediador para manter o Cream unido.

Entretanto, Clapton havia se cansando de ficar estagnado no Blues Rock comercial e almejava uma nova abordagem musical, experimental, sem uma “camisa de força”, para o gênero.

Simultaneamente, Steve Winwood estava enfrentando problemas semelhantes no The Spencer Davis Group, onde ele havia sido o vocalista por três anos. Winwood queria experimentar com o som da banda, através da infusão de elementos do jazz, mas acabou deixando o grupo devido a suas diferenças musicais, optando por criar uma nova banda – o Traffic.

Essa banda se separou temporariamente em 1969 e Winwood começou a tocar com seu bom amigo Clapton, no porão deste último, em Surrey, Inglaterra. Winwood e Clapton já haviam colaborado no projeto "Powerhouse".

Clapton ficou satisfeito com as jam sessions, mas estava hesitante em iniciar um novo grupo. Então, Ginger Baker apareceu um dia para sentar-se com eles em 1969, e a banda tomou forma quase final.

Clapton ficou reticente em colocar Baker na banda, porque ele tinha prometido a Jack Bruce que, se eles fossem trabalhar um com o outro novamente, todos os três ficariam juntos outra vez.

Além disso, Clapton não queria se reunir com o Cream apenas nove semanas após a sua dissolução e também não gostaria de lidar com outra situação de estrelato, bastante semelhante com a do Cream.

Mas Winwood, em última análise, acabou convencendo Clapton a aceitar a presença de Baker no line-up, argumentando que o baterista reforçou a musicalidade da banda e que seria difícil encontrar um músico igualmente talentoso. Em maio de 1969, Ric Grech, baixista da banda Family, foi convidado a se juntar a eles.

Notícias da formação do grupo criou um burburinho de emoção entre o público e imprensa, a qual chegou a anunciar a banda como um "Super Cream". O grupo estreou em um show gratuito no Hyde Park, em Londres, em 7 de junho de 1969.

O desempenho foi bem recebido pelos fãs lá, mas incomodou Clapton, o qual pensou que a adulação era imerecida, lembrando de seus dias de Cream quando as multidões aplaudiam quase tudo.

Eric Clapton
Clapton, sabendo que a banda não havia ensaiado o suficiente e não estava preparada, estava relutante em sair em turnê e temia que o grupo se transformaria em uma repetição do Cream.

Steve Winwood estava sob contrato com a Island Records, tendo que ser "alugado" a Polydor Records (gravadora a qual Clapton e Baker estavam no Reino Unido). Possivelmente, como parte deste negócio, um single promocional foi lançado pela Island, embora a promoção fosse somente para a própria gravadora.

O single apenas anunciava o fato de que a Island Records estava mudando seus escritórios. Intitulado "Change Of Address From 23 June 1969", a promo unilateral contou com uma jam instrumental do grupo que não foi sequer mencionado na capa (cuja única outra informação era coisas como os novos endereço e telefone da Island Records).

O single foi gravado no Olimpic Studios, provavelmente em algum momento entre março e maio de 1969, estimando-se que cerca de 500 cópias do mesmo foram produzidas, sendo principalmente enviadas para DJs do Reino Unido e outros membros da indústria da música.

A canção foi finalmente lançada quando a mesma apareceu como faixa bônus em um CD duplo, "Deluxe Edition", do álbum Blind Faith, em 2000 (intitulada "Change Of Address Jam").

A gravação do álbum prosseguia, seguida de uma curta turnê na Escandinávia, onde a banda tocou em shows menores e os permitiam ensaiar seu som, preparando-os para públicos maiores nos EUA e Reino Unido.

Após a Escandinávia, a banda fez uma turnê nos Estados Unidos, fazendo sua estreia no Madison Square Garden, em 12 de julho de 1969, diante a mais de 20 mil pessoas. A banda excursionou por mais de sete semanas nos EUA, terminando sua turnê no Havaí, em 24 de agosto de 1969.

Um grande problema com a turnê foi que a banda possuía apenas algumas canções em seu catálogo - o suficiente para encher cerca de uma hora. Então, o grupo foi forçado a tocar músicas de seus antigos conjuntos, como Traffic e Cream, para o deleite de uma multidão que geralmente preferia seus materiais mais velhos e populares às novas composições do Blind Faith.

Assim, Clapton agora se encontrava exatamente onde ele não queria estar - preso em um "Super Cream" – o que estava causando tumultos durante seus shows ao vivo. Mais que isso, estava tocando o mesmo material de seus dias de Cream, para apaziguar o público e para preencher o vazio deixado pela falta de material do próprio Blind Faith.

Assim, a gravação do álbum foi interrompida pelas supracitadas turnês na Escandinávia e, em seguida, aquela pelos Estados Unidos entre 11 de Julho (Newport) e 24 de agosto (Hawaii), apoiada por bandas como Free, Taste e Delaney & Bonnie and Friends.

O LP foi gravado às pressas e o lado dois consistiu em apenas duas músicas, uma delas uma Jam Session de 15 minutos intitulada "Do What You Like".

O lançamento do álbum provocou controvérsia porque sua capa contou com o topless de uma menina púbere, segurando em suas mãos um objeto de prata alado, que alguns o percebiam como fálico.

A gravadora nos EUA remitiu-o com uma capa alternativa (que mostrava uma fotografia da banda na parte da frente), bem como a original.

A arte da capa foi criada pelo fotógrafo Bob Seidemann, amigo pessoal e ex-colega de apartamento de Clapton, e que é conhecido principalmente por suas fotos de Janis Joplin e Grateful Dead.

Seidemann escreveu que ele se aproximou de uma menina que possivelmente teria 14 anos, no metrô de Londres, e a questionou sobre a modelagem para a capa.

Steve Winwood
Eventualmente, o fotógrafo se reuniu com os pais dela, mas a garota se revelou demasiadamente velha para o efeito que ele queria. Em vez disso, a modelo usada foi sua irmã mais nova, Mariora Goschen, que se dizia ter 11 anos. Mariora inicialmente solicitou um cavalo como pagamento, mas em vez disso recebeu cerca de 40 libras.

Rumores bizarros vieram à tona com o lançamento do disco e foram alimentados pela controvérsia, incluindo que a menina era filha de Baker ou mesmo que seria uma groupie mantida como escrava pela banda, entre outras insanidades.

A imagem, intitulada "Blind Faith" por Seidemann, tornou-se a inspiração para o nome da própria banda, a qual estava sem nome quando a obra foi encomendada.

Vamos às faixas:

HAD TO CRY TODAY

O ritmo começa cadenciado, mas com uma pegada semelhante à que Eric Clapton fazia anteriormente no Cream. A melodia é suave, mas com o peso na medida exata. A seção rítmica preenche o ambiente, permitindo que o guitarrista exiba seu talento habitual, incluindo um solo vibrante em torno dos 3 minutos de execução e outro magnífico ao final da faixa. Belíssima canção!

A letra fala sobre amor e liberdade:

I'm taking the chance to see the wind in your eyes while I listen
You say you can't reach me but you want everyone to be free



CAN'T FIND MY WAY HOME

Uma leve, suave e envolvente melodia abre a menor música do álbum, "Can't Find My Way Home". A interpretação de Steve Winwood é tocante, fator determinante para a beleza incomum da canção e a sensação de profundidade que a mesma transmite. O aspecto acústico apenas exacerba a beleza da faixa.

A letra expressa o sentimento de mudança:

Come down off your throne
And leave your body alone
Somebody must change
You are the reason
I've been waiting so long
Somebody holds the key
Well, I'm near the end
And I just ain't got the time
Well, I'm wasted
And I can't find my way home

“Can't Find My Way Home” é uma das canções-símbolo do Blind Faith. Inúmeras são as versões cover que já foram feitas para a faixa, contando nomes como Gilberto Gil, Joe Cocker, Styx e Black Label Society.



WELL ALL RIGHT

Um ritmo simples e contagiante marcam a terceira canção do trabalho. Há a inevitável influência sessentista na melodia, com os vocais sendo divididos entre Winwood e Clapton. Winwood, inclusive, faz um vigoroso solo de piano no meio da execução. Destaque para o baixo de Ric Grech, bem proeminente.

A letra fala sobre as coisas triviais da vida:

Well all right, so I've been foolish
Well all right, let people know
About the dreams and wishes that you wish
In the night when lights are low

Trata-se de um cover da versão de “Well... All Right” gravada por Buddy Holly.



PRESENCE OF THE LORD

Poucas palavras podem definir a beleza de "Presence Of The Lord". Os vocais estão na mais perfeita harmonia com a parte instrumental, em um casamento sublime. A guitarra de Clapton executa uma melodia lindíssima, acompanhada com grande maestria pelos demais. No momento do magistral solo do guitarrista o ritmo se eleva, com andamento um tanto quanto mais rápido, voltando tudo à normalidade depois, com a voz impecável de Winwood e a guitarra de Clapton ao fundo. Espetacular!

A letra se refere à busca de um sentido para a vida:

I have finally found a place to live
Just like I never could before
And I know I don't have much to give,
But soon I'll open any door



SEA OF JOY

Bele, leve e tocante, assim é "Sea Of Joy", a qual conta com forte inclinação mais acústica. Os vocais de Winwood são novamente impecáveis e a guitarra de Clapton, quando aparece, brilha intensamente com o talento inegável de um dos melhores guitarristas da história. Mas o grande destaque é o lindo solo de violino, cortesia de Ric Grech.

A letra é uma metáfora pela busca da felicidade:

Once the door swings open into space
And I'm already waiting in disguise
Is it just a thorn between my eyes?
Waiting in our boats to set sail
Sea of joy



DO WHAT YOU LIKE

A sexta - e última - faixa de Blind Faith é "Do What You Like". Esta canção é diferente de tudo que o ouvinte presenciou até aqui. Com uma certa pegada progressiva, o grupo faz uma grande apresentação de seus talentos individuais, com solos magníficos de Winwood, Clapton e Baker. Fecha o álbum com grande estilo!

A letra é simples, com uma mensagem de liberdade:

Open your eyes
Realize you're not dead
Take a look at an open book
Do what you like, that's what I said
Do what you like



Considerações Finais

Após a turnê norte-americana supracitada, a qual terminou em agosto, a banda voltou para a Inglaterra cercada por rumores de dissolução ou de uma possível turnê pelo Reino Unido. Em outubro, o grupo havia efetivamente se dissolvido após um ano de sua criação e nunca mais gravou um outro disco de estúdio ou ao vivo.

Várias faixas ao vivo da banda podem ser encontradas no álbum The Finer Things, de 1995, sendo este uma retrospectiva da rica carreira de Steve Winwood. Outras gravações foram incluídas nas edições especiais, em CD, do Blind Faith.

O álbum fez um tremendo sucesso, atingindo o topo das paradas dos Estados Unidos e Reino Unido, fato impressionante!

Ginger Baker
Depois disso, Eric Clapton saiu dos holofotes, primeiro a integrar a Plastic Ono Band e, em seguida, fazendo uma turnê como apoio para o Delaney & Bonnie and Friends, de quem havia se tornado bom amigo durante a turnê norte-americana.

Assim, libertou-se dos holofotes os quais tinha considerado uma praga tanto para o Cream quanto para o Blind Faith. Após sua passagem como músico de apoio, levou vários membros do Delaney & Bonnie para formar um novo super-grupo, o Derek and the Dominos.

Clapton jamais deixou sair completamente de seu repertório as canções do Blind Faith, como "Presence Of The Lord" e "Can't Find My Way Home", sendo estas tocadas ocasionalmente ao longo de sua carreira-solo.

Ao contrário de Clapton, Ginger Baker adorou sua experiência no Blind Faith e criou um desdobramento da banda, na forma do Ginger Baker's Air Force, contando tanto com Grech quanto com Winwood.

Depois de alguns shows juntos, Winwood e Grech deixam o conjunto de Ginger Baker e vão para a Island Records com a finalidade de reformar o Traffic. Winwood, mais tarde, construiria uma carreira-solo de sucesso e Grech foi membro de vários grupos antes de sua morte, em 1990, devido a uma hemorragia cerebral.

Em julho de 2007, Clapton e Winwood se reuniram para uma participação durante o segundo Crossroads Guitar Festival, realizada no Toyota Park Center de Bridgeview (Estados Unidos), onde o duo tocou uma série de canções do Blind Faith como parte do repertório.

A partir de então, os dois fizeram várias apresentações em conjunto tocando o repertório do Blind Faith.

Winwood, Grech, Baker e Clapton

Formação:
Steve Winwood - Teclados, Vocal, Guitarra
Eric Clapton - Guitarras, Vocal
Ric Grech - Baixo, Violino, Vocal
Ginger Baker - Bateria, Percussão, Vocal

Faixas:
01. Had to Cry Today (Winwood) - 8:48
02. Can't Find My Way Home (Winwood) - 3:16
03. Well All Right (B.Holly/J.Allison/JB Mauldin) - 4:27
04. Presence of the Lord (Clapton) - 4:50
05. Sea of Joy (Winwood) - 5:22
06. Do What You Like (Baker) - 15:20

Letras:
Para o conteúdo completo das letras, recomenda-se o acesso a: http://letras.mus.br/blind-faith/

Opinião do Blog:
A reunião de talentos extraordinários como Eric Clapton, Steve Winwood e Ginger Baker, além de Ric Grech, não poderia ter um resultado ruim. Mas a qualidade do material produzido é tão fantástico que marcou a história do Rock de maneira poucas vezes igualada.

Clapton ficou empolgado com o surgimento do Blind Faith, mas a presença de seu ex-colega de banda, Ginger Baker, um baterista de qualidade incrível, mas altamente problemático, decretou o grupo como um natimorto. A presença de Baker fez Eric Clapton reviver todos os problemas que levaram ao fim do Cream.

Mas é interessante notar que a estrela mais brilhante do Blind Faith é Steve Winwood, com sua voz belíssima e atuação impecável, tanto nos vocais quanto como instrumentista, além de assinar metade das composições presentes no trabalho. Sem Winwood, dificilmente o álbum Blind Faith seria marcante como o é.

Claro que Eric Clapton brilha com sua guitarra, com solos e riffs que marcam um dos melhores guitarristas que o mundo já viu. Ginger Baker também está incrível - seu solo em "Do What You Like" é fantástico. O mesmo pode ser dito quanto à qualidade do trabalho de Ric Grech.

As letras são boas e enriquecem a obra.

Com apenas 6 faixas e todas não menos que brilhantes fica até difícil apontar destaques. Claro que há sempre menção ao sucesso de "Can't Find My Way Home", música de um bom gosto raríssimo e sutileza tocante. Assim como todo o talento virtuoso de "Do What You Like", um presente para todos os ouvidos.

Também não há como não destacar a beleza deslumbrante e comovente de "Presence Of The Lord", uma das mais belas composições de todos os tempos.

Enfim, com gênios como Steve Winwood e Eric Clapton envolvidos, dificilmente um álbum não seria incrível como Blind Faith o é. Mais que obrigatório e clássico, o disco único do grupo é peça essencial para admiradores do Rock, uma obra-prima de primeira grandeza. Apenas fica o lamento da duração efêmera da banda e o sonho de quantas outras peças de artes ela poderia ter construído.

1 de maio de 2015

BOSTON - BOSTON (1976)


Boston é o álbum de estreia da banda norte-americana homônima, ou seja, o Boston. Seu lançamento oficial aconteceu no dia 25 de agosto de 1976, através do selo Epic Records. As gravações duraram de outubro de 1975 a abril de 1976, em diferentes estúdios, com a produção sob responsabilidade de John Boylan e Tom Scholz.

Boston, o álbum, é um dos maiores sucessos comerciais da história da indústria fonográfica. O Blog tratará do início e formação da banda para depois abordar o supracitado disco.


Tom Scholz começou a compor música por volta de 1969, enquanto ele estudava no Massachussetts Institute of Technology (MIT), onde escreveu uma canção instrumental intitulada "Foreplay".

Enquanto frequentava a MIT, Scholz se juntou à banda "Freehold", onde conheceu o guitarrista Barry Goudreau e o baterista Jim Masdea , que viriam a se tornar membros do Boston. O vocalista Brad Delp foi adicionado ao grupo em 1970.

Depois de se formar (com um grau de mestre), Scholz trabalhou para a Polaroid, onde usou o seu salário para construir um estúdio de gravação no seu porão e para financiar 'fitas demo' gravadas em estúdios profissionais

Estas 'fitas demo' foram gravadas (em vários momentos) com Brad Delp nos vocais, Barry Goudreau na guitarra, Jim Masdea na bateria, e Scholz na guitarra, baixo e teclados. As mesmas eram enviadas para as gravadoras, mas recebiam rejeições consistentes.

Em 1973, Scholz formou a banda Mother's Milk com Delp, Goudreau, e Masdea. Esse grupo se desfez em 1974, mas Scholz, posteriormente, trabalhou com Masdea e Delp para produzir seis novas demos, incluindo "More Than a Feeling", "Peace of Mind", "Rock and Roll Band", "Something About You" (em seguida, intitulada "Life Isn't Easy"), "Hitch A Ride" (em seguida, intitulada "San Francisco Day"), e "Don't Be Afraid".

Scholz afirma que eles terminaram quatro das seis canções até o final de 1974 e finalizaram "More Than a Feeling" e "Something About You", em 1975. Scholz tocou todos os instrumentos nas demos, exceto a bateria, a qual foi tocada por Masdea, além de usar pedaleiras que foram concebidas por ele mesmo para criar o som da guitarra desejado.

Tom Scholz
Além disto, o “som de violino” das guitarras presente nas canções foi criado no início de 1970, por Scholz, e foi uma inovação verdadeiramente distinta na música norte-americana.

Esta última fita demo atraiu a atenção dos promotores Paul Ahern e Charlie McKenzie. Masdea deixou a banda quase ao mesmo tempo. Segundo Scholz, os gestores insistiram para que Masdea fosse substituído antes da banda obter um contrato de gravação.

Scholz e Delp assinaram um contrato com a Epic Records logo após a partida de Masdea, graças a Ahern & McKenzie.

Antes que o acordo fosse finalizado, a banda teve que fazer uma audição ao vivo para os executivos da gravadora. A dupla rapidamente recrutou Goudreau na guitarra, o baixista Fran Sheehan e o baterista Sib Hashian para criar uma unidade executora que fosse capaz de replicar no palco as ricas gravações em camadas de Scholz.

A apresentação foi um sucesso e a banda concordou em lançar 10 álbuns ao longo dos próximos seis anos.

Além da demissão de Masdea, a gravadora também insistiu para que Scholz regravasse as fitas demo em um estúdio profissional. No entanto, Scholz queria o registro fosse gravado em seu estúdio particular, no próprio porão, a fim de que ele trabalhasse em seu próprio ritmo.

A pedido de Tom Scholz, Masdea tocou bateria na faixa "Rock and Roll Band" e a instrumentação foi gravada em seu estúdio. Assim, o resultado da gravação foi então levado para Los Angeles, onde Brad Delp acrescentou vocais, sendo o álbum mixado por John Boylan.

Foi neste momento que o grupo foi batizado de "Boston", por sugestão de Boylan e do engenheiro de som Warren Dewey.

Foi durante a mixagem do álbum que Tom Scholz foi para Los Angeles e se encontrou novamente com Boylan e Delp. Scholz afirmou ter ficado intimidado, inicialmente, com os engenheiros profissionais, já que ele havia gravado as faixas em seu porão. Mas, posteriormente, Scholz percebeu que, na realidade, eles possuíam um rico arsenal de possibilidades nas mãos, mas não possuíam as habilidades que Scholz adquiriu com sua experiência em seu próprio estúdio.

Boylan encontrou seu único real confronto com um Scholz autocrático durante a fase de mixagem, em que Scholz cuidava de guitarra e bateria; e Boylan Dewey dos vocais, com Steve Hodge como auxiliar. Scholz colocou as guitarras muito altas na mixagem, tornando os vocais de renderização inaudíveis por algumas vezes.

Toda a operação foi descrita como "uma das ações corporativas mais complexas da história do mundo da música." Com exceção de "Let Me Take You Home Tonight", o álbum foi uma cópia virtual das fitas demo.

O álbum foi gravado por um custo de alguns milhares de dólares, uma quantia irrisória em um setor acostumado a gastar centenas de milhares de dólares em uma única gravação.

O disco Boston foi composto principalmente de canções escritas muitos anos antes de suas aparições no álbum. Scholz escreveu ou co-escreveu todas as músicas do álbum, tocou praticamente todos os instrumentos e gravou (participando da engenharia) de todas as faixas.

O som do Boston combina "grandes, gigantes ganchos melódicos" e "maciçamente pesadas partes de guitarra, de inspiração clássica."

Brad Delp
Para Scholz, a idéia de belas harmonias vocais foi inspirada no grupo The Left Banke, e o aspecto das guitarras foi influenciado pelos Kinks, o Yardbirds e pelo Blue Cheer.

Outro elemento de assinatura do "som do Boston", em termos de produção, envolve o equilíbrio entre guitarras acústicas e elétricas. Para este fim, Scholz inspirou-se em sua audição de infância de música clássica, observando que o "conceito básico" era fixar o ouvinte em uma mudança que está chegando durante uma canção, sendo que tal efeito havia sido explorado por centenas de anos naquelas composições.

O registro também faz uso de vários solos de guitarra harmonizados e dispositivos melódicos barrocos conhecidos como mordentes.

A capa clássica, desenhada por Roger Huyssen, foi idealizada também por Tom Scholz. Vamos às faixas:

MORE THAN A FEELING

Uma bela melodia embala os momentos iniciais de um dos clássicos da música pop internacional: "More Than A Feeling". O ritmo sempre permanece preenchido por um envolvente e suave riff o qual ganha peso apenas quando se aproxima do refrão. Os vocais são construídos de maneira a contribuir com o sucesso da faixa, bem como o solo de guitarra. Trabalho excepcional do grupo!

A letra é sobre nostalgia e o poder que uma canção pode ter na vida de alguém:

When I'm tired and thinking cold
I hide in my music, forget the day
and dream of a girl I used to know
I closed my eyes and she slipped away
She slipped away, She slipped away

“More Than A Feeling” é um dos maiores clássicos da música em todos os tempos. Sua repercussão e sucesso foram quase instantâneos ao seu lançamento.

Segundo Tom Scholz, a versão final da canção levou quase 5 anos para ser finalizada. A música “Walk Away Renee”, do The Left Banke, foi uma inspiração para sua composição.


Lançada como single, atingiu a excelente 5ª posição da principal parada norte-americana de singles. Ficou com a 22ª colocação em sua correspondente britânica.

Está na 39ª posição da lista Top 100 Hard Rock Songs, de 1999, feita pelo canal VH1.

São inúmeras as versões covers feitas de “More Than A Feeling”. Como exemplo, cita-se Ingram Hill, No Mercy e Nirvana. Aliás, muitos críticos musicais encontram semelhanças entre “More Than A Feeling” e “Smells Like Teen Spirit”.

Está presente em filmes e animações como Foxes (1979) e Madagascar: Escape 2 Africa (2008). Também aparece em diversos programas e séries da TV norte-americana. Aparece, ainda, no game Rock Band.



PEACE OF MIND

Já em "Peace Of Mind", o Boston aposta em um riff o qual possui maior peso e intensidade da guitarra, embora desenvolva uma melodia cativante e maliciosa, leve e impressiva na mesma certeira tonalidade. Nesta composição, o flerte com o Hard Rock setentista é mais nítido e palpável. Outro momento gratificante do álbum.

A letra se refere ao tempo em que Scholz trabalhava na Polaroid e tentava deslanchar com a banda:

Now everybody's got advice they just keep on givin'
Doesn't mean too much to me
Lot's of people out to make-believe they're livin'
Can't decide who they should be.
I understand about indecision
But I don't care if I get behind
People li vin' in competition

Lançada como single, atingiu a 38ª colocação da principal parada norte-americana desta natureza. É outro clássico da banda de Tom Scholz.


Está presente nos games Guitar Hero III e Rock Band. Entre os covers mais famosos, está o da banda Stryper, com participação do próprio Tom Scholz na guitarra.



FOREPLAY/LONG TIME

"Foreplay" é uma canção com óbvias e determinantes orientações progressivas, sendo de extremo bom gosto. Após 2 minutos e meio, um inspirado solo de guitarra introduz "Long Time", um rock com melodia suave e encantadora, com vocais que se casam perfeitamente com a parte instrumental. Novamente, Scholz opta por intensificar o peso da guitarra especialmente no refrão e nos momentos que o precedem e o Boston consegue fazer isto como quase nenhuma outra banda.

A letra fala da fugacidade do tempo:

Well I'm takin' my time, I'm just movin' on
You'll forget about me after I've e been gone
And I take what I find, I don't want no more
It's just outside of your front door

Também foi lançada como single, alcançando a 22ª posição na principal parada norte-americana de singles.

A canção é composta por 2 diferentes músicas que se fundem, “Foreplay”, um prelúdio instrumental de origens progressivas e “Long Time”, um Hard Rock mais direto. A revista Rolling Stone definiu a faixa como um perfeito casamento entre Led Zeppelin e Yes.

Os três solos de guitarra de “Long Time” são tocados pelo guitarrista Barry Goudreau.

Está presente no game Rock Band e aparece na série de TV, Supernatural, no final da segunda temporada. Além disto, o Rascal Flatts fez uma versão para o clássico.



ROCK & ROLL BAND

Esta é a menor canção de todo o álbum e vai direto ao ponto: um rock simples e direto, que flerta deliberadamente com o Hard, mas dosando de maneira equilibrada sua melodia envolvente e o peso da guitarra. Bons, embora simples, trabalhos da bateria e baixo. Os vocais são ótimos e contribuem fundamentalmente para a qualidade da composição. Tiro certeiro!

A letra se refere à própria banda:

Well, we were just another band out of Boston
On the road and tryin' to make ends meet
Playin' all the bars, sleepin' in our cars
And we practiced right out in the street

Foi “Rock & Roll Band” a música que Paul Ahern tocou para Charlie McKenzie a fim de convencê-lo a assinarem contrato como empresários do Boston.

A música acabou se tornando uma marca do Boston, tendo intensa circulação nas rádios e caindo no gosto dos críticos musicais, mesmo não tendo sido lançada como single. Aliás, o grupo consistentemente iniciava suas apresentações com esta faixa.

Está presente nos games Rock Band e Guitar Hero World Tour.



SMOKIN'

Um riff muito bom, pesado e intenso, é a base para a ótima "Smokin'". A faixa bebe fartamente no Hard Rock com influência Bluesy e consegue um resultado final invejável. Os vocais são novamente parte fundamental da qualidade da música, contando com um ótimo solo de teclado o qual nos faz lembrar de Jon Lord e do Deep Purple. Momento extasiante do álbum.

A letra é simples, em tom de celebração:

Get your feet to the floor, everybody rock and roll
You've got nothing to lose just the rhythm and blues, that's all,yeah
We're gonna feel ok
We'll pick you up and take you away
Get down tonight

“Smokin'” também acabou se tornando um clássico das rádios de Rock dos Estados Unidos, com intensa veiculação desde o lançamento do álbum, em 1976. O Anthrax gravou uma versão para a música em seu EP Anthems, de 2013.



HITCH A RIDE

A canção se inicia de maneira leve, suave e envolvente, com os vocais se casando de maneira perfeita com a melodia instrumental. Mesmo quando a seção rítmica entra na música, o peso não se intensifica. Os teclados novamente têm função destacada na faixa, mas o ponto mais alto são mesmo os vocais, construídos de maneira tocante.

A letra é em tom de liberdade:

Life is like the coldest winter
People freeze the tears I cry
Words of hail their minds are into
I've got to crack this ice and fly



SOMETHING ABOUT YOU

Uma melodia vocal também suave, mas um pouco mais melancólica, abre a canção. Mas logo o ouvinte estará diante de um Hard Rock com guitarra proeminente e pesada, com um espírito alegre e festivo. A bateria está especialmente mais destacada nesta faixa. Os vocais continuam com o mesmo nível elevado e o solo de guitarra, embora curto, conta com muito feeling. Momento saboroso do álbum.

A letra é sobre amar:

When I was younger I thought I could stand on my own
It wasn't easy, I stood like a man made of stone
But there was something about you (I want you to know),
It brought a change over me (it's starting to show)
I've got this feeling inside,
Got to have you, have you,
Ain't no good to hide



LET ME TAKE YOU HOME TONIGHT

A oitava - e última - canção de Boston é "Let Me Take You Home Tonight". A derradeira faixa do álbum aposta em uma melodia muito suave e leve, com doses quase homeopáticas de peso.  O ritmo permanece assim por quase toda sua extensão, sendo que no minuto final o andamento da faixa acelera, dando um aspecto de clímax para o encerramento do disco, efeito construído de modo inteligente.

A letra é em tom de liberdade e amor:

I don't wanna make excuses, I don't wanna lie
I just got to get loose
With you tonight



Considerações Finais

Catapultado pelo sucesso de “More Than A Feeling”, o álbum atingiu altas posições nas paradas de sucesso. Ficou com a extraordinária 3ª posição na principal parada norte-americana. Conquistou a 11ª colocação na parada britânica e, ainda, o 4º e o 7º lugares nas paradas alemã e canadense, respectivamente.

Tom Scholz, então com 29 anos, planejava abandonar seu sonho de rock and roll; ele ainda trabalhava na Polaroid durante as primeiras semanas após o lançamento do registro. Scholz sentia-se pessimista sobre o sucesso até que o álbum vendeu 200 mil cópias.

Já em janeiro de 1977, o disco de estreia havia vendido dois milhões de cópias, tornando-se um dos álbuns estreantes que mais rapidamente vendeu tantas cópias da história do rock.

O álbum acabou por receber vários prêmios, incluindo uma indicação ao Grammy de Melhor Artista Novo. Com uma popularidade maciça, o Boston chegou a ser colocado no patamar de estrelas estabelecidas, como Peter Frampton, Fleetwood Mac, e Stevie Wonder.

Todas as oito músicas do álbum ainda recebem divulgação regular em rádios de rock clássico até hoje, em todo os Estados Unidos.

De uma pequena turnê de 6 semanas, prevista anteriormente ao lançamento do disco, o Boston acabou fazendo outra que duraria 10 meses. Scholz se recorda de ficar extasiado quando via que as pessoas já conheciam as canções do grupo.

O Boston finalmente começou a ser Headliner em shows a partir de 1977 e esgotando quatro shows no sul da Califórnia, com um intervalo de uma semana. Bob Seger and The Siver Bullet Band fez a abertura para o grupo em Detroit. O sucesso era tanto que a banda esgotou os ingressos para 3 apresentações em New York City, no famoso Madison Square Garden.

Por conta de seu álbum de estreia, o Boston é apontado por muitos críticos musicais como o pivô da mudança do Rock mainstream norte-americano de uma origem baseada no Blues e no “Proto-Metal” para uma sonoridade que se aproximava mais do Pop.

Depois do sucesso do álbum, seu som se tornou imitado por várias outras bandas de rock proeminentes da época. Além disto, o registro criou um ponto de referência para os valores de produção e tecnologia de estúdio que perdurariam durante anos.

O álbum Boston já ultrapassa a casa de 18 milhões de cópias comercializadas no mundo.


Formação:
Tom Scholz - Guitarras Elétricas, Guitarra-Solo, Guitarras Acústicas, Órgão, Baixo
Brad Delp - Vocal, Guitarra Acústica
Sib Hashian - Bateria
Jim Masdea - Bateria em "Rock & Roll Band"
Barry Goudreau - Guitarra-Base, Guitarra-Solo em "Foreplay / Long Time" e "Let Me Take You Home Tonight"
Fran Sheehan - Baixo em "Foreplay" e "Let Me Take You Home Tonight"

Faixas:
01. More Than a Feeling (Scholz) - 4:44
02. Peace of Mind (Scholz) - 5:02
03. Foreplay/Long Time (Scholz) - 7:47
04. Rock & Roll Band (Scholz) - 2:60
05. Smokin' (Delp/Scholz) - 4:22
06. Hitch a Ride (Scholz) - 4:12
07. Something About You (Scholz) - 3:48
08. Let Me Take You Home Tonight (Delp) - 4:44

Letras:
Para o conteúdo completo das letras, recomenda-se o acesso a: http://letras.mus.br/boston/

Opinião do Blog:
A influência e importância do álbum de estreia do Boston permanecem até hoje, mesmo quase quarenta anos após o seu lançamento original. Seu sucesso gigantesco mudaria o rumo da música norte-americana, especialmente para o final da década de 70, bem como para a seguinte.

São incontáveis os grupos que passaram a simular a sonoridade que surgiu com o álbum Boston (e também com o disco de estreia do Foreigner), assim como bandas que nasceriam já praticando este estilo, após o lançamento do disco, já apontando para o direcionamento musical conhecido como AOR. Journey, REO Speedwagon e Styx são apenas exemplos que compravam a afirmação. Também a música Pop seria influenciada, especialmente pelo sucesso de "More Than A Feeling".

Fato é que o álbum de estreia do Boston, um gigantesco sucesso comercial, é o registro inicial do talento inegável de Tom Scholz não apenas como músico e compositor, mas também como homem de estúdio, já que suas inovações na gravação do disco seriam seguidas dali para a frente.

O que mais impressiona no álbum Boston é que todos os detalhes são pensados de modo que contribuam para o resultado final das canções. É tudo feito com extremo bom gosto e com muita precisão.

Um trabalho que vendeu tanto e se tornou tão influente não possui músicas de enchimento. Todas as faixas são, no mínimo, muito boas. As letras, simples, são feitas para que o ouvinte as cante junto com o desenrolar do disco.

Claro que "More Than A Feeling" se tornou um patrimônio musical da humanidade, sendo conhecida em todo o mundo e tendo embalado diferentes gerações após seu lançamento. Qualquer crítica que venha a desqualificá-la soa ao Blog como leviana.

Mas o álbum não é apenas isto: o flerte contundente com o Hard Rock setentista somado ao talento de Scholz como compositor resultou em uma coleção de canções memoráveis."Peace Of Mind" é ótima, a dobradinha "Foreplay/Long Time" é pulsante, além da excelente "Smokin'", uma das melhores composições do Boston.

Enfim, o álbum de estreia do Boston é um marco na música norte-americana que influenciou um sem número de grupos e artistas que surgiriam depois. Se o leitor tem a mente mais aberta e é desprovido de maiores preconceitos musicais irá se deliciar com a beleza das composições. Álbum obrigatório e fundamental na história do Rock.